sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Maybe we should go together.

Desde sempre desejei fazer um diário de viagens com os lugares que fui, as delícias que provei, os momentos que passei em alguma praia, tentando descrever a surrealidade de um pôr do sol magnífico ou os simples momentos passados com pessoas indescritíveis. E foi aí que sempre residiu meu problema em fazê-lo. Todas as minhas descrições pareciam tolas demais, infantis, nunca alcançando o objetivo de mostrar quão bons ou ruins foram meus momentos. Passei a escrever apenas os lugares que frequentei no rodapé das páginas da minha agenda e as pessoas com que estive, sem detalhes ou qualquer descrição. Apenas o lugar e as pessoas, para que eu nunca esquecesse os caminhos que percorri e quem esteve comigo na caminhada.

É sempre muito difícil escrever sem pesar. O drama, a facilidade de expressar uma dor, característica talvez de uma futura atrizcantora, doses pesadas de choro, carregado de infelicidades, bom... há algum tempo isso não faz parte de mim. Tantas vezes deixei bem claro que seria feliz para sempre, me forcei a sorrir, escrevi sobre qualquer coisa entre lágrimas de sucesso efêmero e nada mudava, meus pesares e tristezas e dramas e reclamações eram recorrentes e voltavam sempre. Até parar. Sem razão aparente, sem motivo aparente, até parar simplesmente, sem que eu fizesse força, sem que eu me obrigasse a mostrar meus dentes por aí.

Talvez porque passei a agradecer ao invés de pedir. Pedir apenas para os outros, que fiquem fortes, que sejam felizes, que conquistem seus méritos. Eu agora apenas deixo bem claro o que gostaria de fazer e agradeço o que recebi. O que recebo sempre foi bom demais, mas estou divagando! Ah! Tudo bem, sem problemas, nada é perdido quando se tenta mostrar o bom, assim penso. Voltando ao assunto de viagens, bem, nunca fiz um diário e nunca farei talvez, porque já comecei muitos e agora só começo o que sei que vou terminar. Sempre escreverei no rodapé da minha agenda meus dias e noites tão belos e bem vividos, os horários dos meus vôos e contemplarei trêmula talvez meu passaporte carimbado, minha mala de viagens com muitas etiquetas, minha agenda cheia de rodapés que ocupem páginas e mais páginas, mas desta vez gostaria de falar desta viagem.

Abrir uma exceção, mostrar detalhes não convencionais. De trás para frente é uma boa ideia para relembrar. A delícia de ficar no terraço de um albergue, na entrada, jogando poker ou conversa fora, tomando um guaraná bem gelado, ah, nem poderia, mas eu não ligo mais. Minha saúde é ruim independente da minha força de vontade, então parei de me restringir às delícias e o calor estava muito intenso, de fazer suar logo depois de um banho gelado na ducha forte do banheiro compartilhado. Tomar banho era a melhor parte do dia com certeza. As amizades internacionais me faziam respirar em inglês a ponto de chegar nos restaurantes e fazer o pedido em inglês como se fosse de outro país até me chamarem a atenção em inglês e dizerem que eu estava falando inglês porque meus amigos, recentes e internacionais, não falavam português. Eu tampouco falava espanhol, mesmo muito parecido com o português, ou holandês, meninas bonitas e de índole maravilhosa, aquelas holandesas. Loiras que só e, apesar da fama, muito inteligentes, essa coisa de rótulos ah, tão irritantes! Pessoas burras existem de todas as cores. Enfim, eu falava em inglês e me embaralhava na hora de mudar para o português e fazer o pedido como brasileira com orgulho que sou.

Chilenos, dois. Holandesas, duas. Uma brasileira brasiliense meio mineira perdida pelo Rio de Janeiro sozinha no Terrasse Hostel, perto da maravilha que é a praia de Ipanema. Uma amizade boa, quase instantânea que nos fazia dizer sempre "maybe we should go together". Jantamos juntos, loirinhas, moreno, branquinho, ruiva desbotada, fomos à praia e compartilhamos juntos o prazer de torrar no sol e jogar mau-mau em português, em holandês um nome que jamais saberei reproduzir novamente, passar protetor solar nas costas uns dos outros com as mãos cheias da areia que não nos largava. Primeiro um guarda-sol e uma cadeira, depois mais uma cadeira, depois outro guarda-sol, porque o sol estava mesmo de lascar. Não fiquei ardida graças as minhas passadas esporádicas de protetor solar fator 30 que logo acabou e passei para o quinze, acabei rosada ao invés de camarão frito como normalmente ficaria.

De madrugada, sendo solidários com a minha causa de ter que ficar acordada para não perder o vôo de manhãzinha cedo, a grande ideia partida de mim ou de todos, não sei bem dizer, de nadar no mar. Eram duas de uma madrugada muito quente, suando na varanda tomando piscolita, um drink chileno, ou piscoraná que era o meu caso já que coca-cola não é para o meu bico, quando resolvemos nadar de roupa e tudo. Deixamos nossos pertences nas mochilas no quarto para dez, pegamos a toalha cedida pelo hostel que nos recebeu maravilhosamente bem, e fomos. "Is that legal?" - Os chilenos perguntaram, porque no Chile não se pode nadar no mar a noite. "Everything is legal here." - Disse o recepcionista da madrugada do hostel, um negro simpático com um sorriso de virar de cabeça para baixo. Fomos os quatro, holandesa, chileno, chileno, brasileira, uma holandesa cansada ficara no quarto, tentando dormir. As mãos gelavam na água fria, mas ficamos com as roupas de baixo mesmo assim tomando caldos das ondas que só víamos quando já estavam bem perto de nós, no momento em que já era tarde demais. Um último mergulho no mar antes de ir para casa, revigorante, e já estou com saudade de uma amizade sem maiores interesses além do único de ir juntos para qualquer lugar, sem horário marcado, nos encontrávamos ao acaso e ao acaso saíamos andando para jantar ou tomar um coco gelado, que o chileno adorou. "Awsome!", ele disse quando provou a castanha. "So sweet", eu disse.

Um dia fez com que a viagem inicialmente entediante cheia de estudos e solitária para mim se tornasse uma viagem inesquecível, cheia de altos e sorrisos em inglês. De baixos, apenas os pesadelos durantes a noite e as minhas falas engraçadas enquanto dormia de quarta para quinta, de resto, tudo perfeito. A caipirinha de melancia forte demais ou a água do lado da cama que me salvou de tosses violentas, tudo perfeitamente onde deveria estar. Nenhum tropeço, nenhuma falha, tudo perfeitamente ensolarado, mesmo o primeiro dia, terça-feira chuvosa, mesmo a quarta-feira compromissada recheada de sucesso, a caminhada pela areia.

Se for para a Holanda um dia, saberei onde ficar. E é claro que direi antes de qualquer coisa, uma água no saguão, uma conversa na calçada, uma caminhada pela avenida na beira da praia: "Maybe we should go together". E poderei acrescentar sem medo: "My friend".

Um comentário:

Claudia Bittencourt disse...

Adorei o texto, Manxa.
Me deu vontade de fazer as mesmas coisas também! Maybe we should go together. :)