quarta-feira, 26 de março de 2014

A Manhã de Mexericas Azedas Voltou Sem Amor

Sacudi meu cabelo e sem querer senti o cheiro bom. Uma frase basta para sintetizar? Gostava de subir as escadas de tijolos vermelhos verificando se meu cabelo estava cheiroso e se eu estava branquelinda o suficiente. Os degraus eram poucos até o primeiro andar e eu só podia me arrumar durante o primeiro lance de escadas porque o segundo já era de frente para a porta aberta vestida de caveiras em um fundo colorido. Era gostoso pensar nos detalhes: rímel a prova de suor, mas nem sempre adianta. E eu ria das minhas pequenices bobagentas de pulso rápido. Algumas coisas ficam gostosas na memória. Gosto de contar como Queen, another failed romance, pena.Talvez eu quisesse ser de alguma forma importante. Eu nem sei. Parece que fico lembrando em looping sem conseguir entender, exatamente, o que senti ou o que tenho agora.

Tentei outros caminhos. Outra pessoa. Pessoa nenhuma. Então me achei sentindo nada jogando Candy Crush matando aula (eu, matando aula, a piada do dia, da semana, do ano, por que eu fiz isso comigo mesma?) acabada na cama com os olhos coçando de alergia. Samba canção, regata, cabelos desgrenhados. Como se ainda esperasse. Não consegui ficar com outra pessoa. Não por mais de dois dias. Tinha medo do toque do celular. Enchia a garrafa de água compulsivamente e prendia o xixi até explodir correndo no banheiro. Anteontem ganhei uma caixa de chocolates suíços, crime previsto nas leis da minha vida e acabei com ela. Hoje fiz um manifesto contra mim mesma a favor do meu corpo e da minha sanidade. Condenei-me a parar de uma vez por todas.

Não morri de amores. Talvez seja mais um sentimento de fracasso. Não consegui o que queria e, poxa, queria tão pouco. Quase nada. Sempre pouco exigente. Talvez agora eu sonhe o mundo e consiga pouco mais que grudar na parede gelada às espaçadas quartas-feiras. Resolvi escrever um livro sobre meus amores, mas mal sei distinguir amores de paixões de aventuras de casinhos de quedas de desisti logo no início. A ideia de fazer letras para as músicas que tem implodido no meu cérebro se tornou uma ideia melhor.

Sabe do que eu gosto? De coisas simples. E gosto de não querer. Gosto de acontecer. As coisas andam tão difíceis de acontecer ultimamente. Tudo tem que ser programado, antecedido, avisado. Insuportável. Logo a minha vida que costumava ser tão interessante, súbita. Não pensava duas vezes antes de enlouquecer. Agora me guardo no pote de margarina, fechadinha na geladeira, esquecida.

Meus processos escritos são sempre delimitadores de momentos, rituais de passagens, tomadas de decisões, abandonos. Aqui sempre acabo enterrando alguma coisa, algum sentimento, alguma saudade. Hoje enterro minha espera, minha hipocrisia e minha preguiça. Quando a luz de alguém se acende nas minhas noites costumo não deixar queimar porque não gosto de substituições. Tenho apego àquela lâmpada. Não acredito em substituições. Hoje quero aprender a andar no escuro e apagar tudo. Que permaneça minha audição, que me arraste o tempo.

E se uso meu passado para dramatizar? De forma alguma dramatizo. Não estou sofrendo. Só... falando. Costumo não falar, não sei conversar. Não sei dizer. Só faço disso tudo uma forma de produção. Me serve de reflexão, de lembrança, um presente para mim mesma do futuro.

Foi bom. E passou. Que pena. Ainda bem.
No bem bipolar de estar, decreto passado o presente escrito e deixo no ar a minha vontade de mudar que já mudou.

Eu pulo daqui. E passo pra lá.
De luzes apagadas, meus sonhos são maiores agora.
E tem trilha sonora...

sábado, 8 de março de 2014

Around.

Limpei a baba quando levantei a cabeça antes encostada na mesa de vidro. Dormira em cima do enroladinho de queijo e presunto temperado enquanto dois amigos escutavam Damrau operar a Rainha da Noite no Youtube. O resto da casa dormia em silêncio, sem se incomodar com as notas agudíssimas das obras. Ficar acordada tem sido difícil, os dias se arrastam, para variar. Hoje era um dia especialmente melancólico, Bon Iver nos fones de ouvido com a música que não paro de escutar há uma semana. Decidi instantaneamente que o próximo vídeo seria Gethsemane. Deixaria pra me preocupar com os graves depois.

Os dentes estavam grudando. Tinha comido tudo. Pão de queijo, biscoito de queijo, enroladinho de salsicha, bolo verde de alguma coisa coisa fofa com alguma coisa cremosa por cima. Azedinho, bom de arder o maxilar na antecipação salivante de imaginar.

Conseguiria ser mais do que isso?

Dormira sacudindo as pernas de um lado para o outro, boca aberta, imagem típica do cansaço estampado na pele. Então todas as coisas se mostraram ainda mais difíceis e lentas. O famoso processo.

Não fazia a menor ideia do que era ou do que deveria fazer, a não ser andar automaticamente e transitar pelos compromissos e metas. O sono não ia embora. Passara do limite da qualidade de vida para atingir as terras do sem fim de mim mesma. O vazio humano igualado ao caos. Sentia ódio, aquele que antecipava os dias líquidos tingidos de vermelho e dores viscerais. Não era fácil ser mulher com tantas homenagens cor de rosa, degradê e lilás, mas gostaria de receber uma rosa despretensiosa. Rosas tem um significado tão poderoso que essa poderia ser só uma rosa vinda pelo vento, sem mãos aparadoras que cobram resultados para os presentes e dádivas.

A solidão habita, alheia às fisicidades presentes. É mais do que deixar a companhia em outro cômodo. É mais do que prestar atenção no círculo imaginário que rodeia e cerca os limites dos membros esticados de um corpo caçador. Solidão é a dor muscular aliada ao sol de domingo. Solidão são meus hormônios invadindo as membranas do meu olhar, aquele olhar que carrega o mundo devagar em fases periféricas e harmônicas.

A minha solidão é deitar, fechar os olhos e não sonhar. Nunca mais sonhar.

O sábado seria atípico, o cigarro dizimado, minha dignidade perdida entre deixar dormir e terminar de escrever.

No meu mundo tem pavê.

Pior é ter o vazio do caos e ter o cérebro manco ocupado pelo que se passa na burrice de sentir e teimar. 

Cochilei. Tive um sonho breve em que o assédio vestia avental cor de pele com rendas brancas.

Dormi de vez.

segunda-feira, 3 de março de 2014

"I'm a lover. And a fighter." - Michael Jackson Backwards

"Tell my love to wreck it all

Cut all the ropes and let me fall"
- Skinny love: Birdy


E então, em uma das poucas conversas que tenho com alguém, me pego treinando o inglês com a minha mãe. De repente, sem contexto, já que não tenho o hábito de desabafar, e sem precedentes, minha mãe solta uma frase que desperta em mim um sonho doce adormecido há algum tempo.

Passo a maior parte da minha vida sozinha em silêncio.
E tem sido triste.

"He's not the one. And he knows it."

Primeiro eu ri pensando na música idiota que essa frase me lembrava.
Depois fui parando a palhaçada, cuspindo a pasta de dente, sem fala.
Olhei fixamente para o espelho do banheiro escuro: o que me aguardava além daqueles minutos era um quarto cheio de livros e uma cadela dodói. A comida nas panelas, um rascunho no computador.

Não preciso ir muito longe pra conseguir chorar um pouco, o que também tem deixado de ser uma coisa comum em mim. Às vezes o olho arde e tudo parece congelar no meu corpo que esconde um cérebro delirante, mas nada cai. Isso tem mudado e sinto as amarras se soltando e pontes se formando no lugar dos muros inabaláveis. Tem sido triste e dolorido, mas é bom. Sinal de que minhas engrenagens voltaram a funcionar. É bom que doa. E eu deixo doer, mesmo sabendo exatamente o que fazer.

Por um dia, um dia no escuro, eu decidi me abrir. Mas no escuro foi tudo igual e nada surtiu efeito. Os mesmos sorrisos, com um pouco de histórias demais da minha parte, sem querer, só fui falando. Nem sei se eu deveria escrever sobre isso. Mas eu entendi quando deveria parar. Entendi agora.

As pessoas me vêem na condição de pessoa segura, independente, e é verdade. Eu sou a minha liberdade. Mas em algum lugar dessa mulher de um metro e setenta e quatro e meio existe a menina que vê em um abraço um cantinho pra morar, que vê num beijo promessas antiquadas, que acha nas mãos dadas um motivo pra entender que chegou em casa. Aqui também existe a vontade de segurança que não venha de mim. É que faz tempo, a última vez que me senti amada. E, bom, às vezes entendo que tenho sentimentos genuinamente inocentes: eu acredito no amor. 

Mas nada em mim transborda mais, entende? Ficou tudo guardadinho em uma caixa só minha, dentro do meu coração. Então deixa eu esparramar um pouco onde eu quiser... já que não consigo dizer ou demonstrar ou sumir.

Em meio a tantos compromissos e responsabilidades que faço questão de honrar e manter, encontro um tempo pra respirar e deixar que o próprio tempo perca o significado, mesmo depois de colocar o despertador pro dia seguinte pela manhã. Respirar é tão bom que faz com que muito de mim cresça e renasça. Uma vontade de estar, de ficar, permanecer. Um hiato na minha vida corrente. Nunca tenho vontade de ir embora, mas a mania de não querer atrapalhar é sempre muito mais forte. E eu vou, então.

É tempo de ida. Tempo de deixar para trás. Tempo de fazer com que meu mundo valha para os que estão ao meu lado. Não sou fresca, mas tá doendo e não era pra ser exatamente assim. E não é legal doer e saber que não tem solução. O jeito é ir e tentar ser um dia a primeira opção ao invés de última.

A gente entende que deve parar quando a expectativa é muito maior que a realidade. A gente entende que deve parar quando tudo vem muito intenso e desencontrado. Descompassado. A gente entende que deve parar quando não consegue pensar em mais nada além dos momentos de respiração alheios a tudo. Alheios ao tempo. A gente entende que deve ir justamente quando não tem mais pra onde ir.

Foi sem querer. Na real a gente nunca sabe quando vai se apaixonar por alguém ou não, né. A gente aceita os riscos da casualidade e deixa que o mundo siga como quiser. E ele, pra mim, sempre insiste em seguir tão errado, assim, nesse sentido. Meus sentidos todos indo na direção oposta.

Contei as vezes que escutei essa música. 23 vezes.
Mas não importa agora. Tô indo embora. De novo.

Lutar por mim, ainda e sempre.