segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Outro domingo.

Ele sempre me olhava como se não quisesse ir embora, com a pressa de quem tinha que ir, com o cuidado de dizer com os olhos que deixava o coração comigo. Sempre me olhava até o último minuto, eu com uma frestinha de porta aberta o via soltar um beijo, um sorriso, necessariamente nesta ordem, e olhar para a estrada que vinha nos atropelar depois.

Eram sempre fins de semana juntos, juntos, juntos. Eram sempre dias juntos, juntos, juntos. Éramos inseparáveis, os dias eram insuficientes, as horas curtas demais, os minutos inexistentes com exceção dos minutos passados esperando um ao outro, sempre longos estes sempre tempo demais. Eram bons e poderiam ter sido para sempre bons se não fosse pela vida que leva e traz o que merecemos de acordo com os nossos feitos e valores.

Quando vimos, passou. Difícil é substituir o que claramente não tem substituição. E sempre ficam as memórias, cada vez mais acumuladas na cabeça, confundindo tudo. Eu queria não ter que acumular tantas despedidas, mas elas se amontoam na minha lembrança de tudo o que vivi e uma se destaca em especial, aquela que eu não deveria ter deixado fugir do real. Mas foi e como tudo que se vai, foi porque tinha que ir e, bom, quem sou eu para tentar evitar os acontecimentos, a roda viva, a roleta russa que se não nos mata, nos leva alguém que achávamos que nunca iria embora.

Lembro dos óculos escuros inseparáveis. Das tardes no lago e de algumas coisas que minha memória inventou. Estas são as mais perigosas: aquelas que a gente fantasia mas que nunca chegaram a acontecer. Os planos desfeitos, bom, temos outros tão bons quanto agora e uma excitação sem tamanho para chegar lá. Lá aonde, nenhum de nós sabe e acho que nenhum de nós se importa, chegar é que é o importante. E lembrar do que foi bom com carinho, sem pesares, foi porque tinha que ir e é sempre melhor assim.

Ruim é ficar na mesma, e eu fico na mesma de acumular.


Queria parar de ter que me despedir, dizer tchau até logo adeus, nunca mais.

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Tudo cinza.

Talvez eu não esteja em mim agora, mas é domingo, preciso escrever. Domingo, quatro e quarenta e três da manhã e eu ainda não dormi. Sinto como se minhas roupas não existissem, numa verdade nua e crua. Eu vivo agora e não me importo com o que virá. O agora é que importa, as conseqüências serão boas se os atos forem bons também.

Penso assim, meio simples, meio caipira, às vezes um tanto gourmet. Ainda estou tossindo muito forte, de vez em quando acho que minha doença nunca vai passar. Seja lá qual for, os médicos não sabem se decidir se é refluxo, alergia ou tuberculose. Claro que não tuberculose, o drama faz parte da situação.

Quero falar de cuidado! O toque que passa primeiro pelo rosto, de olhos claros, os cabelos desgrenhados, o suor, que passa logo pelas costas, um brinde ao amor sem álcool, apenas no olhar e neste toque. Que passa pelo corpo com cuidado, que olha com cuidado, que assopra com carinho e sorri como se tudo fosse um sonho.

Nunca se sabe quanto vai durar esse momento. Fica eterno em mim, sempre, para sempre. De um jeito impossível de esquecer, fica marcado, como o pulo na piscina gelada de madrugada, de todas as vezes em que decidi enlouquecer momentaneamente. Talvez seja louca mesmo para sempre sem querer. E não escondo que mesmo que por um momento possa ser amor. Tudo com cuidado, as luzes apagadas, respiração. É amor, sim, porque não.

O tempo faz tudo tão direitinho, adoro a sensação de viver tudo que tenho pra viver. Uma dose de tequila e meu mundo começa a rodar, José... E agora? Estou feliz de sentir que não me importo! Estou feliz agora. Vivi a minha vida agora e não desperdicei um momento sequer. Fiz o que quis sem medo, sem receio, e de roupas de baixo pela madrugada gelada na piscina.

Minha cama quentinha, meu edredon, são as únicas coisas que me esperam agora, tenho certeza. Depois de viver um sonho que me estampa um sorriso pro resto da vida, não preciso de mais nada. E foi uma dose de tequila só.

Ainda tusso, de euforia, talvez. Uma garrafa d'água de um litro e meio me acompanha todos os dias, renovada todos os dias com água do filtro de barro. Leio, estudo e espero a vida acontecer pra mim. Só tenho a agradecer por ela vir tão linda, tão intensa, tão perfeita pra mim.

Perfeito mais ainda seria o céu se um galo cantasse desafinado debaixo da minha janela e uma grama verdinha cheia de orvalho fosse meu quintal. Ou talvez diferença nenhuma faria, o amor chegou em mim e pode ir embora se quiser. A eternidade ficou plantada na minha alma, e daqui só nasce o que for bom.

Incrível, incrível. Às vezes me sinto tão pronta pra partir... mas ainda tenho uma missão, acho. Tenho que descobrir e é tão bom filosofar ao vento, escrever sobre a minha falta de tormento e virar poeta sem sofrer. Quem diria, não sofro mais. Sinto por quem duvida tão firme que fico me remoendo pelo meu passado, lindo, passado, ficou para trás. Eterno também, mas lindo e sem motivos pra me derrubar.

Eu estarei para sempre em ascensão.
Atenta ao furacão de cores que me assola todos os dias sem nunca parar.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Madness.

Essa não é uma história feliz, tampouco cheia de esperança. Ela não tem volta, aconteceu de verdade há muito tempo atrás e vem acontecendo ainda até hoje sem que nada possa ser feito. Não existe paliativo. A dor é constante e mesmo que mascarada por momentos abençoados, ela continua e não vai parar nunca.

O sorriso no meu rosto e no rosto da minha família esconde uma saudade de dias melhores. Um dia talvez, quem sabe, um dia espero possa fazer uma pesquisa primorosa sobre isso, mas hoje não tenho estômago, meu coração é fraco e, querendo ou não, tenho que conseguir tomar conta de mim ao menos, mas quero dizer que escondo essa saudade. E sei que não vai passar.

Loucura na minha casa tem o significado literal. Nunca dizemos que somos loucos por nada. Dei uma pausa para tirar foto de um raro momento, os cinco irmãos juntos. Não enlouqueça, não enlouqueça eu insisto, não deixe o mundo engolir o que há de bom, que a autodestruição não seja a solução para os nossos problemas, que o sol brilhe por dentro mesmo que o dia seja de chuva, nublado e medonho.

Ouvir a voz do meu irmão mais velho em suas palavras desconexas me deixa o rosto encharcado. Ouvi-lo perguntar por mim e dizer que estou bonita e ficar vermelho logo depois faz com que eu queira fugir para quando eu ainda tinha dez anos de idade, quando ele ainda tinha seus momentos bons. Hoje ele é assombrado por "eles" que ninguém sabe quem são, quer conquistar o território nacional com contratos no computador e diz que dentro do avião é confortável, mas é ruim porque as muitas pessoas declaram guerra umas as outras em pleno voo.

Um livro que ele nunca viu está desatualizado, no mundo dele que ninguém pode entrar. Um mundo que só ele consegue ver, só ele tem acesso com senhas. Ele mora numa casa enorme, mas diz morar num quartinho sem banheiros, porque "eles" não deixam que seja diferente. Ele fez um plano de trabalho que está presente em todo o território nacional, junto com "eles" e patrocinado por "eles", os caras que comandam a vida do meu irmão e que ninguém nunca viu.

Ainda há pouco ele entrou no meu quarto e disse oi, Amanda, você tá aqui. Eu disse sim, estou, senta aqui. Perguntou quem eu encontrei na internet e disse uma amiga. Ele falou jogar o papo fora e eu disse às vezes é bom. Ele pegou meu violão sem uma corda e perguntou se podia afinar. Eu disse claro, mas está sem uma corda. Ele disse tá sem uma corda? Tudo bem. Tudo bem, eu disse. E ele começou a afrouxar todas as cordas indiscriminadamente, eu pensei, mas ele chegou a uma combinação linda de afinação e começou a tocar como nos tempos em que ele ainda ficava bem. Tocava guitarra, acho que eu já tinha dito... E meus olhos já se enchiam de água mais uma vez enquanto ele dedilhava o violão, tocando um blues com as cordas afrouxadas.

Meu irmão mais velho tem uma loucura dentro dele que ninguém nunca entendeu, mas que eu sempre achei linda. O que me pesa são os momentos em que ele se sente assombrado, em que os alienígenas o impedem de divagar, quando o mundo, cheio de gente louca, solta gritos de guerra, ratos por todos os lados saindo dos esgotos e de cada cantinho das paredes de casa. Meu sobrinho de 13 anos já pode trabalhar na cabeça do meu irmão, e ele quer saber com o que, se tem uma marca associada, e ninguém discute, todo mundo entra na loucura, alguns de má vontade, outros apenas por ser mais fácil assim e logo o assunto acaba, ninguém sabe exatamente como conversar. Ele anda pela casa sonhando acordado, sem coragem de ler os livros, mas achando-os interessantes pelos títulos, querendo saber como a comida é feita para que não esteja envenenada. O extrato de tomate é feito de cogumelos, não tomates e assim ele tem um mundo colorido só dele, mas que às vezes pode ser muito escuro e triste. E é quando eu sinto o que ele sente mesmo de longe, mesmo a quase 2000km de distância.

A saudade que não passa é saudade dele, dos dias em que ele ainda sorria sem olhos arregalados, dos dias em que ele ainda podia dormir e me levar para a escola de música, me ensinar a tocar violão, dirigir seu fusquinha amarelo. Dos dias em que ele ainda podia piscar debaixo daqueles óculos quadrados sem que ninguém o estivesse esperando na esquina. Dos tempos em que "eles" ainda não existiam.

Minha família tem esse mistério irresoluto, uma vontade de que fosse diferente e mãos amarradas. O que podemos fazer é deixá-lo respirando, só ele sabe como se entreter. Uma conversa besta não faz efeito, mas se colocá-lo na frente da televisão ele se permite sorrir com os desenhos animados. Ele não é débil, não é idiota e passando na UnB em primeiro lugar, bom... vamos dizer que também não é burro. Pelo contrário, ele sempre foi o mais inteligente da casa, mas a vontade de ser sociável o destruiu. A vontade de ser diferente sendo que já era em sua forma mais limpa fez com que seu futuro se resumisse a saídas com sanduíches no Mc Donald's e uma repulsa pelo sol. Ele diz que o sol dá trabalho e que o sol é a poeira das ruas, que gruda na pele e faz queimar. Às vezes, em sua loucura, meu irmão é poeta sem querer.

Apesar de tudo, foi ele quem me manteve na linha. A lembrança dele não me deixou desistir, não me deixou enlouquecer. A lembrança dele me manteve longe das drogas e perto da música. Faço da música minha profissão em homenagem a ele que sempre quis um futuro livre mas foi atropelado pela rua, pela realidade mais dura, pelo lado mais sombrio de uma vida que tinha tudo pra dar certo mas que foi acorrentada pelo mal.

Por causa dele sei que existem pessoas más que fazem coisas ruins com a gente. Por causa dele sei que maus exemplos existem e estão próximos demais. Eu faço questão de afastar. Ao contrário dele, quero manter o sol na minha vida e cultivar o bem e queria que ainda fosse possível o retorno, para isso seria útil uma máquina do tempo, para curar as feridas e a loucura irremediável que assola os fracos, que domina meu irmão e todas as partes do corpo dele.

Ele voltou para tocar violão mais uma vez. Parece que eu to tocando com a mão esquerda, falou. Eu disse você está tocando com as duas, mano. E ele sorriu debaixo dos óculos, um meio sorriso, olhos semi cerrados e o prazer de estar de volta às raizes, com a irmã caçula atenta às notas, querendo que aquele momento durasse para sempre.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Sunday.

Não costumo mais agitar coisas para fazer. Isso era uma coisa que eu fazia em São Paulo que dava muito certo, mas agora acho que gostaria de passar momentos mais reservados, mais comigo mesma. Descobri que tem sempre aquela fase da vida em que queremos estar mais quietos e que não ligamos, por exemplo, se ninguém ligar para fazer alguma coisa num fim de semana ensolarado.

Hoje dormi até dizer chega, literalmente. À medida que ia acordando pela manhã, várias vezes, sentia mais vontade de ficar na cama, para ver se o tempo passava mais rápido. Ansiedade para a viagem de amanhã, talvez. Um nervosismo gostoso de querer saber pra onde a vida vai me levar. Gosto que seja assim, gosto que tudo flua assim.

Então, me levantei, vesti um roupão, preguiça de tomar banho, e me sentei no sofá da sala para assistir um programa de TV que me surpreendeu por causa de um bloco em que os famosos levavam e recomendavam livros que faziam parte de suas vidas. Adorei as indicações e fiquei com vontade de ler todos eles, mas como todo mundo que senta para assistir TV, fiquei ali parada só vendo o tempo passar. Logo começou um filme, aquele em que tudo ganha vida no museu, engraçadinho, mas não aguento tanto tempo na TV, então resolvi caçar minha irmã. Ela havia saído para andar de slackline e desde a hora em que acordei queria aproveitar meu domingo de sol com a minha cadela, o monstro negro da casa.

Mandei uma mensagem, catei um pano velho, um potinho de plástico, tomei um banho rápido, calcei o tênis e coloquei o animal ofegante no carro. Que dia lindo, sei que ela pensou, porque eu pensei também, e fui. Não chamei ninguém, nem olhei o celular.

Cheguei e soltei a Hennah. Ela correu tanto que achei que fugiria, mas, mesmo de quase longe, ficava de olho para não me perder de vista. Depois de ser atacada por poodles valentes e muito enjoados, subir em cima da colcha de piquenique de uma mulher estranha e mau humorada, comer o pão de uma família e os ossos do churrasco, a cadela voltou pra mim. Minha irmã de biquini e short andava na fita bamba e ria enquanto eu só ficava olhando a cadela causar no parque da cidade.

Meu dia ensolarado se resumiu a uma alegria simples e sem tamanho. Olhar o animal correr e vir de repente para derrubar o pote de água, um carinho com cheiro de grama, uma lambida inesperada no rosto. Nada mais a esperar, nada para receber ou dar. Mais um lindo dia, obrigada, enfim.


sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Maybe we should go together.

Desde sempre desejei fazer um diário de viagens com os lugares que fui, as delícias que provei, os momentos que passei em alguma praia, tentando descrever a surrealidade de um pôr do sol magnífico ou os simples momentos passados com pessoas indescritíveis. E foi aí que sempre residiu meu problema em fazê-lo. Todas as minhas descrições pareciam tolas demais, infantis, nunca alcançando o objetivo de mostrar quão bons ou ruins foram meus momentos. Passei a escrever apenas os lugares que frequentei no rodapé das páginas da minha agenda e as pessoas com que estive, sem detalhes ou qualquer descrição. Apenas o lugar e as pessoas, para que eu nunca esquecesse os caminhos que percorri e quem esteve comigo na caminhada.

É sempre muito difícil escrever sem pesar. O drama, a facilidade de expressar uma dor, característica talvez de uma futura atrizcantora, doses pesadas de choro, carregado de infelicidades, bom... há algum tempo isso não faz parte de mim. Tantas vezes deixei bem claro que seria feliz para sempre, me forcei a sorrir, escrevi sobre qualquer coisa entre lágrimas de sucesso efêmero e nada mudava, meus pesares e tristezas e dramas e reclamações eram recorrentes e voltavam sempre. Até parar. Sem razão aparente, sem motivo aparente, até parar simplesmente, sem que eu fizesse força, sem que eu me obrigasse a mostrar meus dentes por aí.

Talvez porque passei a agradecer ao invés de pedir. Pedir apenas para os outros, que fiquem fortes, que sejam felizes, que conquistem seus méritos. Eu agora apenas deixo bem claro o que gostaria de fazer e agradeço o que recebi. O que recebo sempre foi bom demais, mas estou divagando! Ah! Tudo bem, sem problemas, nada é perdido quando se tenta mostrar o bom, assim penso. Voltando ao assunto de viagens, bem, nunca fiz um diário e nunca farei talvez, porque já comecei muitos e agora só começo o que sei que vou terminar. Sempre escreverei no rodapé da minha agenda meus dias e noites tão belos e bem vividos, os horários dos meus vôos e contemplarei trêmula talvez meu passaporte carimbado, minha mala de viagens com muitas etiquetas, minha agenda cheia de rodapés que ocupem páginas e mais páginas, mas desta vez gostaria de falar desta viagem.

Abrir uma exceção, mostrar detalhes não convencionais. De trás para frente é uma boa ideia para relembrar. A delícia de ficar no terraço de um albergue, na entrada, jogando poker ou conversa fora, tomando um guaraná bem gelado, ah, nem poderia, mas eu não ligo mais. Minha saúde é ruim independente da minha força de vontade, então parei de me restringir às delícias e o calor estava muito intenso, de fazer suar logo depois de um banho gelado na ducha forte do banheiro compartilhado. Tomar banho era a melhor parte do dia com certeza. As amizades internacionais me faziam respirar em inglês a ponto de chegar nos restaurantes e fazer o pedido em inglês como se fosse de outro país até me chamarem a atenção em inglês e dizerem que eu estava falando inglês porque meus amigos, recentes e internacionais, não falavam português. Eu tampouco falava espanhol, mesmo muito parecido com o português, ou holandês, meninas bonitas e de índole maravilhosa, aquelas holandesas. Loiras que só e, apesar da fama, muito inteligentes, essa coisa de rótulos ah, tão irritantes! Pessoas burras existem de todas as cores. Enfim, eu falava em inglês e me embaralhava na hora de mudar para o português e fazer o pedido como brasileira com orgulho que sou.

Chilenos, dois. Holandesas, duas. Uma brasileira brasiliense meio mineira perdida pelo Rio de Janeiro sozinha no Terrasse Hostel, perto da maravilha que é a praia de Ipanema. Uma amizade boa, quase instantânea que nos fazia dizer sempre "maybe we should go together". Jantamos juntos, loirinhas, moreno, branquinho, ruiva desbotada, fomos à praia e compartilhamos juntos o prazer de torrar no sol e jogar mau-mau em português, em holandês um nome que jamais saberei reproduzir novamente, passar protetor solar nas costas uns dos outros com as mãos cheias da areia que não nos largava. Primeiro um guarda-sol e uma cadeira, depois mais uma cadeira, depois outro guarda-sol, porque o sol estava mesmo de lascar. Não fiquei ardida graças as minhas passadas esporádicas de protetor solar fator 30 que logo acabou e passei para o quinze, acabei rosada ao invés de camarão frito como normalmente ficaria.

De madrugada, sendo solidários com a minha causa de ter que ficar acordada para não perder o vôo de manhãzinha cedo, a grande ideia partida de mim ou de todos, não sei bem dizer, de nadar no mar. Eram duas de uma madrugada muito quente, suando na varanda tomando piscolita, um drink chileno, ou piscoraná que era o meu caso já que coca-cola não é para o meu bico, quando resolvemos nadar de roupa e tudo. Deixamos nossos pertences nas mochilas no quarto para dez, pegamos a toalha cedida pelo hostel que nos recebeu maravilhosamente bem, e fomos. "Is that legal?" - Os chilenos perguntaram, porque no Chile não se pode nadar no mar a noite. "Everything is legal here." - Disse o recepcionista da madrugada do hostel, um negro simpático com um sorriso de virar de cabeça para baixo. Fomos os quatro, holandesa, chileno, chileno, brasileira, uma holandesa cansada ficara no quarto, tentando dormir. As mãos gelavam na água fria, mas ficamos com as roupas de baixo mesmo assim tomando caldos das ondas que só víamos quando já estavam bem perto de nós, no momento em que já era tarde demais. Um último mergulho no mar antes de ir para casa, revigorante, e já estou com saudade de uma amizade sem maiores interesses além do único de ir juntos para qualquer lugar, sem horário marcado, nos encontrávamos ao acaso e ao acaso saíamos andando para jantar ou tomar um coco gelado, que o chileno adorou. "Awsome!", ele disse quando provou a castanha. "So sweet", eu disse.

Um dia fez com que a viagem inicialmente entediante cheia de estudos e solitária para mim se tornasse uma viagem inesquecível, cheia de altos e sorrisos em inglês. De baixos, apenas os pesadelos durantes a noite e as minhas falas engraçadas enquanto dormia de quarta para quinta, de resto, tudo perfeito. A caipirinha de melancia forte demais ou a água do lado da cama que me salvou de tosses violentas, tudo perfeitamente onde deveria estar. Nenhum tropeço, nenhuma falha, tudo perfeitamente ensolarado, mesmo o primeiro dia, terça-feira chuvosa, mesmo a quarta-feira compromissada recheada de sucesso, a caminhada pela areia.

Se for para a Holanda um dia, saberei onde ficar. E é claro que direi antes de qualquer coisa, uma água no saguão, uma conversa na calçada, uma caminhada pela avenida na beira da praia: "Maybe we should go together". E poderei acrescentar sem medo: "My friend".