domingo, 14 de março de 2010

22h09

T-u-d-o dói.


A pele, a unha, a ponta do cabelo.
E mais. Sem detalhes.

As contas, atrasadas.
O telefone, desligado.
O desodorante, sumido.
O cartão, bloqueado.
O dinheiro, abafado.

O resto, é pouco.

Insatisfeita ainda em reclamar, grito ao interno que se cale e siga minha razão.
Modificada pelas tramas do dia, dos céus, acordo o inferno em mim.
Mortificada pelo mau que me causei, abro os braços e deixo o lixo entrar.

De antíteses e sínteses e análises batráquicas jááááá me esgotei na editora.
Não me fabrico mais. Tirei-me dos catálogos e proibi minhas vendas no sebo.
Está vedada a leitura das minhas palavras, impressas tão imperfeitas em mim.

Ergo as mãos e deixo-me apagar.
Primeiro a pressão, fricção, depois os borrões, aos poucos os restos enegrecidos de borracha rolando. Quando vi, me sumi.

Invisibilimei-me! Aleluia.

Posso comprar e dever, agora.
Correr e cair.
Cantar e quebrar.
Gritar e sentir.
Derrubar, derramar e esquecer.

E falaria das flores se invisível fosse.
De como o dia se atreveu a ficar tão azul.
Sussurraria ao ouvido e beijaria o sono.
Seguiria os passos até o cemitério e andaria em direção ao pôr-do-sol.

Esquartejaria os papéis pelo chão,
romperia as barreiras luz-sombra.
Seria o não e o sim, sem causar dor.
Sem sentir dor.

E dormiria dias, noites, dias, noites.
Até o dia se atrever a chuviscar.
Até o dia me beliscar de frio, e ir me desenhando aos poucos.

Primeiro o esboço, o esforço. Depois as linhas levemente definidas.
A silhueta, o perfil.
E logo as roupas. As não-roupas.
Os sapatos desamarrados, as mãos no chão.

E lembrar que nada parou de doer.
Nem por um segundo sequer.

Foi borracha desgastada, só.




Da próxima, tento o apontador.
Ou o backspace.

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