Então você se vê olhando para a tela do computador. Algumas abas abertas, nenhuma conversa, youtube, facebook, músicas que melhor se encaixam na coreografia que você tenta fazer há duas semanas, mudando a cada dois minutos por não saber o que escolher, que escorrem pelos ouvidos por não saber exatamente qual o efeito de se mexer por elas. Conta um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito. Nota que aos poucos aprendeu a dizer não às farras para poder trabalhar em paz e não em cima da hora.
Mas você disse não e você se encontra ainda assim em cima da hora. Sem coreografia. Debaixo dos antebraços, o caderno vermelho repleto de to do lists, cronogramas, compromissos e estrelas. Estrelas significam trabalhos realizados. E no meio da folha, sem estrela, a palavra coreografia. Seu cérebro em páginas pautadas cheias de letras azuis em garranchos misturados com esboços e bossa. A música que você ouve não é das mais felizes, a sua vontade de jogar tudo pro alto é inexistente. Nada te tira de casa hoje. Você só quer produzir. Não quer sair, não quer conversar, não quer brincar, não quer se preocupar com o que as pessoas vão pensar. Não quer perder tempo com a superfície. Quer mais que sorrisos leves e diversão. Quer produção.
E você se vê sentado de frente à tela do computador tentando criar pela primeira vez uma coreografia. Um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito. Já levantou, já rebolou, já mostrou ao mundo pra que veio, mas não conseguiu manter uma sequência digna de memória. Nada. Nada. Quantos oitos são necessários para provar que você sabe se mexer no palco sem parecer uma jamanta de roupas de baixo? Strip tease não serve. Nunca descobriu se sabe fazer um. Não adianta mexer a cabeça aleatoriamente como nas festas. Não serve. Aliás, todas as pessoas do mundo resolveram te chamar para sair. Hoje. E você disse não. Também não pode achar um par de última hora e mostrar os seus ralos passos de dança de salão. Zouk, forró? Não. Abas abertas. Cérebro em convulsão.
Vai dançar All The Single Ladies, Beijinho no Ombro ou Leleklek. Dança funk, sei lá. Vai dançar YMCA. Como uma deusa você me mantém. Dança o silêncio, parada em cima da cadeira e cai desmaiado no chão e se finge de morto. Vem um urso e não te devora porque você está morto. Samba. Na cara da sociedade, né, que seja. Mas não conte um dois três quatro cinco seis sete oito mais do que o necessário para mostrar que você pode se mover direito no palco. Faça nada. Respire. Detone. Desista. Assista. Chora. Puta que pariu, já passou da hora.
Tudo ali. Estático.
Nem seu coração se move.
Barrado.
Estático.
Intocado.
Estável.
Não sabe se o pulso pulsa ou se arrasta. Ou se tarda, ou se arde ou se nada.
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